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07/07/2012

Manifesto da Contra-Acultura


Manifesto da Contra-Acultura
Luiz Carlos Barata Cichetto



A Contracultura foi um movimento que teve origem na década de 50 com a Geração Beat, os chamados “Beatniks”, onde intelectuais, principalmente artistas e escritores, contestavam o consumismo e o otimismo do pós-guerra americano. Os líderes desse movimento foram Jack Kerouac, Allen Ginsberg e William Burroughs. Mas o auge da Contracultura se deu nos anos 1960 com a explosão do Rock. Na segunda metade dos anos 60, Ken Kesey, Alan Watts, Timothy Leary e Norman Brown criaram a teoria e as práticas da Contracultura, ganhando destaque e transformando-se em lideranças do movimento. Muitos acreditam ainda que a deflagração desse movimento se deu bem antes com Jean Paul Sartre, através de seu engajamento político, defesa da liberdade e pessimismo pós-guerra, mas de fato a Contracultura começou a tomar forma e estender suas bases para além das fronteiras, chegando em todas as partes do mundo, onde pensadores como Luiz Carlos Maciel era um dos estandartes mais visíveis. O ponto alto da Contracultura é definido como sendo o Festival de Woodstock em 1969, mas outros festivais de Musica e Arte, nos Estados Unidos, na Europa e até mesmo no Brasil, representaram uma amostra do que poderia ser uma sociedade baseada em princípios simples de convivência em harmonia.

A contracultura, também chamada de cultura underground, cultura alternativa ou cultura marginal, pode ser definida como um movimento que questionava valores centrais vigentes e instituídos na cultura ocidental, aí incluídos todos os padrões de comportamento, como religião, educação e família dos modelos convencionais. A Contracultura buscava, através de formas alternativas, uma transformação da sociedade como um todo, através da tomada de consciência, da mudança de atitude e do protesto político. O Rock foi a trilha sonora, e mais que isso, o catalisador desse movimento, com sua vocação natural à rebeldia e a quebra de tabus.

De um modo geral, podemos citar como características principais deste movimento:
- Arte Auto-cognitiva;
- Valorização da Natureza; 
- Vida Comunitária;
- Antibelicismo;
- Vegetarianismo;
- Respeito a Minorias;
- Liberdade Sexual;
- Anticonsumismo;

Mas acredito que as principais características da Contracultura sejam, crítica aos meios de comunicação de massa como, por exemplo, a televisão; e principalmente a discordância com os princípios do capitalismo e economia de mercado. O uso de drogas psicodélicas, baseado nos estudos de Timothy Leary, principalmente, tinham um contexto diferente: eram usadas como fonte de inspiração e liberação da mente, preparando-a para novas e ricas experiências humanas, e juntamente com os outros elementos chave que formavam a base da Contracultura, estariam transformando o ser humano e a forma como ele enxerga e interage com o mundo, criando assim uma sociedade mais justa e benéfica a todos.

Mas com a chegada dos anos 1980 e o crescimento da tecnologia e da massificação intensa das comunicações, o Movimento Contracultura foi perdendo força, até que, no final do século passado passou a representar apenas um verbete de dicionário, uma referência histórica e nada mais. Os deflagradores desse movimento abandonaram o esse objetivo, provavevel mente cooptados pelo sistema que combatiam, usando o antigo jargão "se naõ pode com eles... 

Sem referências e sem guias, nasceu e cresceu uma juventude sem objetivos, sem porquês e principalmente sem questionamentos válidos e sem "talvez", aceitando de pronto o que os esquemas de massificação lhes oferecia. O mundo parecia mais colorido, sob o ponto de vista do consumo. Cores berrantes, primárias, sem meios tons e sem sobre tons... E a vocação natural de rebeldia, inerente á juventude e aos artistas, perdeu lugar para uma sociedade de consumo sem precedentes. E a velocidade é necessária à industria do consumo. Tudo tem que ser consumido rapidamente para que se compre o que vem a seguir. E essa regra foi alimentada ferozmente, instalada em todos os níveis. Dos bens simples de consumo às artes, tudo passou a ser criado para ser devorado rapidamente. E dentro desse panorama, foi criada uma cultura que, pior que leite instantâneo, sem nem necessidade de colocar nem a água... Tudo pronto para consumo. 

Chegamos ao Século XXI, a Internet explodiu no mundo inteiro. A realização do sonho de compartilhamento livre de informação, em tempo real, sem censura, sem intermediários. Não precisávamos mais depender da grande mídia, dos grandes esquemas de produção e comercio de cultura. Uma biblioteca e um arsenal ao mesmo tempo. Ao alcance dos dedos, dos olhos. Em lugar de uma máquina de escrever, um amontoado de folhas em um mimeógrafo, pernadas, dinheiro de Correio, apenas teclas e cliques. Seria o paraíso da Contracultura... Acaso seu espírito ainda existisse. E não era apenas o espírito da Contracultura que fora soterrado debaixo de toneladas de lixo. Os tempos eram outros, disseram, e trataram de transformar também em um produto de consumo fácil. No início ainda podia se sentir o cheiro de liberdade, mas depois o perfume do consumismo tomou conta. As chamadas redes sociais, que tomaram de assalto aniquilaram qualquer sonho cultural. Acabou com os sites de cultura de uma forma geral, acabou com os Blogs, que eram uma espécie de “panfletos” ampliados. Tudo, a partir de 2004, ficou reduzido à telas azul bebê, com pessoas fúteis e hipócritas, falando sobre futilidades, frivolidades e unhas pintadas...

Junto com isso, as ondas do politicamente correto e da sustentabilidade, - termo que muita gente usa sem saber porra nenhum do significado – transformou tudo em uma massa plástica e uniforme. As pessoas foram reduzidas a meros consumidores, embalados em músicas descartáveis, de refrão fácil, sem nenhuma mensagem. Tudo construído com o único intuito de consumo fácil e rápido. A busca desesperada por uma identidade, em meio a tantos rostos sem faces, transformou a comunicação em algo insuportávelmente chato e sem nenhum conteúdo. Falar de algo mais profundo que a cor da calcinha de uma atriz, ou citar uma frase que não seja de Caio Fernando Abreu ou trecho de poesia de Drummond, acabou sendo perigoso, muito perigoso. O humor se transformou em caso de polícia e os humoristas em bandidos. Uma censura disfarçada de “respeito” à minorias, de todas as matizes. E assim nos transformamos em zumbis apertando teclas de computadores, clicando em desenhos mal elaborados, sem a menor responsabilidade. Dentro das redes sociais, todos ou são belos, ou são inteligentes ou são revolucionários. Todos comparecerem em todos os eventos descolados e na prática ninguém sai da frente do computador. Escutando sem ouvir, quilos e quilos de emepetrês sem a menor qualidade musical. Vendo música, em lugar de escutar... Enfim, tudo em plástico azul do fundo das milionárias redes sociais, criadas por garotos que não tem outro objetivo a não ser amealhar fortuna.

- “Chegou a hora de uma nova revolução de Contracultura?” - Perguntei ao amigo Amyr Cantusio Junior, um dos maiores, mais capacitados e estudiosos músicos do Brasil, que, por seu desejo de se manter íntegro, de se manter fiel às duas idéias e conceitos, muito próximos à Contracultura, luta com dificuldade para mostrar sua arte e manter suas contas.  

- “Não, está na hora de criar a Contra Acultura, pois não existe uma cultura a ser contra, mas sim um aculturamento total e absoluto. Apenas lixo” – Respondeu ele.

E eu concordo!

Quando coloquei acima as definições e conceitos sobre a Contracultura dos anos 60 e 70, percebemos que existiam conceitos pré-estabelecidos dentro da cultura de uma forma geral. A euforia do pós guerra era o pano de fundo para uma cultura estagnada, antiga e sem horizontes. E baseados em conceitos filosóficos de pensadores que enxergavam o mundo sob uma ótica humanista, perscrutando o futuro e temendo o amanhã, lançaram as bases de um movimento que se propunha a carregar a humanidade a um estágio mais avançado, seja através das portas abertas pelas drogas psicodélicas, seja pela assimilação de doutrinas como o budismo, pelo uso da arte como veículo de crescimento e prazer humano.

Mas e agora? O que temos? Não temos nada. E principalmente, não somos nada. A arte se transformou em produto banal, as drogas em anestésicos sociais e as doutrinas em fanatismo religioso. A música, a mais nobre das artes, foi transformada num veiculo para o dinheiro, o estoicismo e a egolatria. Pensar, conforme previu George Orwell, se transformou em crime. A “crimidéia”, as palavras passaram a ser maltratadas e não estar de acordo com os padrões do “politicamente correto”, passou a ser um pesadelo. Sem a censura formal, de coturnos e fardas, passamos a sofrer a Censura do Processo, onde “tudo que você disse pode e será usado contra você”, numa distorção e ampliação, dos limites jurídicos. Achar que faz parte de sua liberdade denunciar alguém cuja opinião não é favorável passou a ser encarado como normal. O aborto, a ser tratado como apenas uma questão de direito feminino, Os conceitos de liberdade foram deturpados, estropiados e estuprados.

Falhamos e falimos enquanto seres pensantes num mundo sem perspectivas, sonhos e objetivos. O capitalismo, cujas bases fincadas no individualismo, faliu ao permitir a ingerência do socialismo, que também faliu. Todos os sistemas políticos faliram, todos os sistemas religiosos faliram, transformados em grandes negócios dominados por uma fé cega e perigosa, todos os sistemas culturais faliram. Enfim, todos os sistemas, de todas as tendências, das religiosas às artísticas, das políticas ás sexuais, também faliram. E o ser humano também faliu, não como sistema, não como tendência, mas como ser pretensamente dominante do Planeta.

Estamos entregues literalmente às baratas e nosso destino é morte, não apenas a morte física de cada um, mas a morte da humanidade. Ainda resta uma esperança? Quem sabe... O que nos jogou nesse ponto, no fundo de um poço escuro não foi o individualismo, mas o egocentrismo, e principalmente a falta de uma cognição mais ampla de nosso papel enquanto criadores de nossas histórias e nossos destinos. Construindo nosso destino através de atos individuais, mas não egocêntricos, estaríamos construindo, cada um de nós, um pedaço de um caminho que carregaria a humanidade ao bem comum. Mas abrimos mão disso, em prol de uma busca por uma segurança financeira falsa, uma beleza falsa e uma sexualidade falsa.

Então, continuamos sentados, esperando que a humanidade acabe, numa noite escura, ou retornemos a busca de nós mesmos dentro do quarto escuro que a deixamos no passado, quando ainda não tínhamos computadores, redes sociais e telefones celulares? Talvez seja mesmo a hora de uma nova revolução cultural, pois a cultura é a base de todo e qualquer desenvolvimento humano, seja no plano físico como no intelectual. Talvez seja a hora de um novo movimento de Contracultura, mas não para rechaçar a existente, pois não existe nenhuma, mas para criar uma nova, uma verdadeira. Não uma “Nova Consciência” como pregavam os Hippies, mas uma “Consciência Verdadeira”, que evolva cada indivíduo. De dentro para fora. Da construção a partir de um. Um país, um planeta, uma Humanidade feita não apenas de seres idênticos, com cor azul bebê, mas uma humanidade de cores diferentes, de matizes e gestos diferentes. Uma humanidade que seja a união de bilhões de “UNS”. E não de bilhões de seres idênticos, entalados e envasilhados, embalados e prontos para consumo.

Estão lançadas as sementes. Da sobrevivência ou da aniquilação. A semente da Contra-Acultura é o UM. Colhamos o que possamos.